29 de mar. de 2010

Todo cliente é VIP, mas uns são mais VIPs que os outros

Nas palavras de Jean Casterède, “Compra-se não o objeto, mas o símbolo. Deixa-se o universo material para adentrar o universo mental”, e neste processo “é luxuoso tudo o que é raro, incomum e não usual”. Isso não é de hoje. Desde os mais remotos tempos nas mais ancestrais das tribos, o luxo é uma forma subjetiva de satisfazer algumas de nossas fantasias de posse, ostentação e coleção que, expostas, nos diferenciam dos demais ou nos colocam em grupos de afinidade. Como o grupo dos VIPs. Mais que um status, ser VIP é uma forma de pertencimento, um life style intimamente ligado a inúmeros rituais e cerimônias de etiqueta, ética e estética. Como o de dar, receber e retribuir. Diz o ditado que “é dando que se recebe”, e é bem verdade que ninguém acessa um mundo de exclusividades gratuitamente. Muitas vezes o preço é alto. Mas em compensação, abrem-se as portas de um mundo de “vantagens”. Estudos de neuromarketing associam esta necessidade a um complexo processo de compensações, que por vezes faz com que as pessoas invistam ou gastem irrefletidamente buscando a antecipação de um prazer de recompensa. “Quanto maior for o estresse a que estivermos submetidos em nosso mundo, maior será nossa procura por bases sólidas. E quanto mais procramos as bases sólidas, mais nos tornamos dependentes da dopamina. E quanto mais dopamina circula por nosso cérebro, mais coisas queremos”, formula Martin Lindstrom, estudioso do neuromaketing. A liquidação em primeira mão, o coquetel de lançamento da coleção, os convites para a pré-estréia, entradas para o show de camarote, as conferences com grandes personalidades (da moda, dos negócios…), atendimento especial, serviços complementares, amostras de produtos, gifts e mais gifts… Quem não quer? Tudo lindo, mas como o outro lado tem sempre o outro lado, o que para uns é acesso para outros é processo. Matéria no Caderno Vitrine p8 da FSP de 13/03/2010 destaca, conforme comentários de Mariana Ferraz, consultora do IDEC (Instituto de Defesa do Consumidor): “A prática de brindes pode incitar a pessoa a comprar só para ter o benefício. Já o fato de os VIPs terem preferência na venda fere o artigo 39 do Código de Defesa do Consumidor, que proíbe os fornecedores de se recusarem a vender produtos caso existam em estoque.” E também cita o advogado Arthur Rollo: “o fornecedor tem que dispensar igualdade de tratamento a consumidores que estão nas mesmas condições”. E na prática, como funciona? Para falar sobre Gifts e VIPs, convido Ismael Rocha, Diretor de Extensão e Operações da ESPM, connoisser do luxus, para versar sobre a questão. MP: O que é ser um “very important client” — um estado de espírito, uma condição social ou um pecado? IR: Ser VIP é uma condição social, pois o mercado define as pessoas por sua capacidade de compra, por sua habilidade em gerar negócios, por seu papel na economia. Desta forma se adquire poder, se ganha destaque perante os outros e passa-se a ser percebido e recebido de forma diferente. MP: Quem paga mais leva mais, leva até um gift. É a lei da selva capitalista. Pode-se cobrar justiça na mercadologia? IR: Marketing é a capacidade de fazer trocas, de forma a que os dois lados (o que vende e o que compra) fiquem satisfeitos. Tem por objetivo fazer com que todas as classes sociais, mediante serviços e produtos ofertados, fiquem felizes com as suas aquisições. De forma justa, equalizada e democrática. O benefício deve ser para todos e não deve haver aspecto negativo. Considerando o gifting, as classes de maior poder aquisitivo recebem itens que lhes trarão benefícios de acordo com as suas expectativas; e as classes de baixa renda, proporcionalmente, recebem gifts de acordo com o seu repertório de objetos de desejo. O valor do gift está associado ao valor percebido para cada target. Discriminar ou não prestigiar o consumidor significa um mau uso tanto do marketing quanto do gifting. MP: Mastige é o luxo para as massas. Como repensar o luxo e o gifting considerando o império da “classe C”? IR: Essa é uma longa história. De forma resumida, entender a classe C no Brasil é entender uma realidade antropológica e sociológica que as leituras sobre o luxo ainda não atingiram, pois se trata de uma classe ascendente, em permanente movimento — um dinamismo único e diferente de economias onde classes não são remanejáveis. Estas pessoas não perderam status e sim estão alcançando novas posições sociais conforme vão subindo. E precisam criar elementos claros que tangibilizam e dão sentido à nova situação. Daí a importância do gifting, gerando símbolos, estigmas e ícones de identidade que mostram para o grupo de referência que certo indivíduo foi a determinado lugar, que tem um status diferenciado, que passa a pertencer a uma nova referência, representação ou grupo social (“eu tenho, você não tem”). Afinal, o consumo de luxo é símbolo de identidade mais que um luxo. É um processo mágico, uma conquista que tem valor importantíssimo por delimitar grupos de pertencimento: status frente ao grupo ao qual pertencem e ao grupo ao qual pertenceram. É… Já diziam as célebres palavras do Big Brother George Orwell: “Os animais são todos iguais, mas uns são mais iguais que os outros”. E se tudo é igual, taí a dica: o gifting deve ser bem diferente. Fique ligado. O mercado está de olho! Dicas, idéias, cases, sugestões? Gifting@umbigodomundo.com.br * Marina Pechlivanis é socia-diretora da Umbigo do Mundo, Mestre em Comunicação e Consumo e integante do GEA (Grupo de Estudos Acadêmicos) da Ampro.

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